Prometida pelo então governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB)
para 2017, a vacina que está sendo desenvolvida pelo Instituto Butantã
continua em fase de testes sem que sua eficácia tenha sido confirmada na
última e mais importante etapa da pesquisa. A queda do número de casos
da doença no País impediu a aplicação do imunizante nos grupos
voluntários, atrasando o estudo.
A promessa do governo do
Estado previa ainda a construção de uma fábrica para a produção das
doses, que deveria estar pronta no fim do ano passado, mas que também
não foi concluída na data estimada. Agora, a nova previsão é para 2019.
A
vacina do Butantã foi anunciada em 2015 como a opção mais promissora
para proteção contra a dengue, em um momento em que a doença batia
recordes de casos e mortes no Estado de São Paulo e no País. Naquele
ano, mais de 1,6 milhão de pessoas entraram para o balanço de casos
suspeitos de infecção.
Alckmin, que já era uma aposta como
presidenciável, pediu prioridade à Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) na aprovação do início dos testes da fase 3 e viajou
para várias cidades brasileiras para acompanhar o trabalho dos
pesquisadores. O então governador esteve em pelo menos 5 dos 16 centros
de pesquisa da vacina: Recife (PE), Cuiabá (MT), Porto Alegre (RS),
Campo Grande (MS) e São José do Rio Preto (SP).
Já a
ex-presidente Dilma Rousseff (PT) esteve em São Paulo, em fevereiro de
2016, para anunciar verbas federais para financiar a última fase de
pesquisas. Na ocasião, destacou que o Brasil dava um passo importante no
desenvolvimento daquele que poderia ser o primeiro imunizante contra a
dengue do mundo de alta eficácia.
Os testes da vacina do
Butantã, no entanto, não evoluíram como anunciado. Iniciada há dez anos,
a pesquisa recebeu, em 2015, a autorização para a fase 3, após ser
avaliada “em regime de prioridade” pela Anvisa, antes mesmo que os
testes da fase 2 tivessem sido finalizados. A autorização foi dada em
dezembro daquele ano e os testes começaram, efetivamente, em 2016.
Exposição menor
Segundo
o Butantã, a queda de casos de dengue no País observada nos anos
seguintes atrasou a pesquisa porque os participantes do estudo ficaram
menos expostos à doença. “A ocorrência de dengue no País está
extremamente baixa, completamente diferente do que foi anos atrás. Isso
faz com que não consigamos comprovar eficácia. Temos coletados, até o
momento, os dados de segurança e todas as análises, mas a dengue ocorre
em picos e tem períodos com maior incidência de casos”, explica
Alexander Precioso, diretor do Laboratório Especial de Ensaios Clínicos e
Farmacovigilância do Instituto Butantã.
A informação de
que a vacina começaria a ser distribuída em 2018 chegou a ser divulgada
pela gestão estadual. O pesquisador nega que tenha havido precipitação
nas datas anunciadas pelos governantes. “Se pegar os dados de 2014 a
2016, a incidência era muito alta, particularmente em 2015.”
O
diretor afirma que, se o número de casos voltar a crescer no próximo
verão, é possível que a eficácia da vacina consiga ser testada. Em nota,
o instituto disse que está trabalhando para que adultos comecem a
receber as doses em 2019.
A predominância de circulação de
um dos quatro sorotipos da dengue também teria interferido no processo.
Isso porque, segundo Ricardo Palacios, gerente de Pesquisa e
Desenvolvimento Clínico do Instituto, quando um sorotipo está circulando
há mais tempo, o número de casos cai porque muitas pessoas já foram
infectadas e ficaram imunes à doença. Quando muda o sorotipo, há um pico
de casos porque há mais pessoas suscetíveis àquele tipo. Como o
sorotipo 1 continuou predominante, não houve o pico.
Atualmente,
a vacina está sendo testada em voluntários de três grupos etários: 2 a 6
anos, 7 a 17 anos e 18 a 59 anos – esta última faixa foi a primeira a
recrutar voluntários e já alcançou o número suficiente de participantes.
Não será necessário alcançar os resultados de eficácia nos três grupos
para fazer o pedido de registro. “Podemos solicitar o registro em
qualquer momento para o grupo com informação de segurança e eficácia”,
destaca Palacios.
Prazos
Para
especialistas em pesquisa, o tempo entre a fase 3 e obtenção do registro
costuma ser de pelo menos três anos. “Considerando a fase 3
especificamente da vacina da dengue, devem ser apresentados dados de
eficácia e segurança de pelo menos dois anos”, diz Alessandra Paixão
Dias, gerente-geral substituta de Medicamentos e Produtos Biológicos da
Anvisa.
Diretor do Núcleo de Estudos e Publicações da
Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses, Marco Aurélio Sáfadi diz
que o desenvolvimento e a produção de uma vacina são sempre um desafio,
além do fato de o vírus da dengue ser complexo. “Como a doença é
imprevisível, podemos ter uma nova explosão de casos no ano que vem.”
Previsão
A
reportagem entrou em contato com o governo do Estado, ainda quando
Geraldo Alckmin (PSDB) exercia o cargo de governador, para questionar
sobre a previsão de chegada da vacina em 2017. A pasta informou que a
resposta seria dada pelo Instituto Butantã. Em nota, o instituto disse
que a “previsão de início da produção da fábrica de vacinas contra a
dengue foi estimada pela antiga direção da instituição”. Sobre a
fábrica, disse que ela está em processo final. “A fábrica pronta não
significa só a estrutura, mas estar preparada para todas as atividades.”
A
previsão é de que seja finalizada no último trimestre deste ano. “Após
alerta da Anvisa em relação à vacina contra a dengue produzida por um
laboratório francês (mais informações nesta página), feito em novembro
de 2017, pesquisadores do Butantã foram destacados para realizar novos
estudos, visando, desta forma, a aprimorar os processos de produção da
futura fábrica”, informou, também em nota oficial. Segundo o órgão, o
objetivo é garantir que a vacina é segura tanto para quem já teve o
vírus quanto para quem nunca teve dengue. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
