Parceria reafirma o papel da escola na rede de enfrentamento à violência e proteção às mulheres
A aposentada * Maria José, 86 anos, sofreu violência doméstica em boa parte dos 63 anos em que esteve casada. “Tive oito filhos, a separação não era uma opção, na minha época. Mesmo apanhando, suportei até o fim”, resigna-se Casos como o da aposentada não são incomuns e têm impactado dolorosamente a história de vida de milhões de mulheres. Para refletir sobre esse fenômeno, a Subsecretaria de Formação Continuada dos Profissionais da Educação promove a 7ª edição do curso Maria da Penha vai à Escola.
Na tarde desta quinta-feira, 25/4, o palestrante foi o juiz Ben-Hur Viza, um dos coordenadores do Núcleo Permanente Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do DF (NJM/TJDFT). Viza apresentou o tema Ciclo de Violência e foi enfático ao afirmar que as mulheres têm sido assassinadas por uma questão de gênero.
A iniciativa conta com a participação de professores, gestores, monitores e membros da rede de proteção. “O objetivo é oportunizar a formação de profissionais da educação para o trabalho de esclarecimento da comunidade escolar quanto aos direitos das mulheres em situação de violência, sobretudo os trazidos pela Lei Maria da Penha”, explicou Elizabeth Moura, uma das coordenadoras do curso.
A formação é realizada em cinco encontros, onde a legislação é contextualizada, inclusive as medidas protetivas de urgência. São também identificadas as redes para a proteção das mulheres no DF e, principalmente, o papel da escola no atendimento inicial aos casos de violência e como um dos componentes da rede proteção às mulheres.
João Marcelo Nunes, professor da Escola de Música de Brasília (EMB) e participante do curso, elogiou a iniciativa. “Se não nos atualizamos, nosso conhecimento é deficitário, principalmente em uma sociedade como a nossa: machista e patriarcal”, ponderou.
Legislação
A Lei n. 11.340/2006 é reconhecida como um dos maiores avanços no combate à violência doméstica e familiar contra mulheres. Popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, faz referência à farmacêutica brasileira, que sobreviveu a duas tentativas de homicídio pelo ex-marido, o que a tornou paraplégica.
De acordo com o professor Lucas Amaral, do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), que coordena o Ciclo de Debates Gênero, Violências e Masculinidades, “o papel do curso ou de todo e qualquer processo educativo é central na construção da equidade de gênero”. Para Amaral, uma educação de qualidade precisa discutir os estereótipos, que são construídos historicamente e baseados em relações de poder.
O trabalho de desconstrução e ressignificação por meio de vivências, rodas de conversas, debates “possibilita que homens e mulheres possam internalizar a ideia de que não precisam atuar no mundo, a partir dos referenciais hegemônicos. A violência como uma linguagem que é quase acoplada à identidade masculina deve ser ressignificada”, defende o professor universitário.
O papel da educação na mudança de perspectiva das mulheres, quanto ao silêncio em relação à violência, tem se manifestado cada vez mais. A filha de * Maria José, por exemplo, deu um basta no relacionamento abusivo com o companheiro. “Ela também foi agredida, mas voltou a estudar e se separou. Depois até casou de novo. Os tempos mudaram”, declarou a mãe com orgulho.